'IL Vestito di Notte' Magritte
Estás no verão,
num fio de repousada água, nos espelhos perdidos sobre a duna.
Estás em mim, nas obscuras algas do meu nome e à beira do nome
pensas:
teria sido fogo, teria sido ouro e todavia é pó,
sepultada rosa do desejo, um homem entre as mágoas.
És o esplendor do dia, os metais incandescentes de cada dia.
Deitas-te no azul onde te contemplo e deitada reconheces
o ardor das maçãs, as claras noções do pecado.
Ouve a canção dos jovens amantes nas altas colinas dos meus anos.
Quando me deixas, o sol encerra as suas pérolas, os rituais que previ.
Uma colmeia explode no sonho, as palmeiras estão em ti e inclinam-se.
Bebo, na clausura das tuas fontes, uma sede antiquíssima.
Doce e cruel é setembro.
Dolorosamente cego, fechado sobre a tua boca.
José Agostinho Baptista Paixão e Cinzas (1992) In Biografia Lisboa, Assírio & Alvim, 2000